Empresas recorrem à inteligência artificial e a simulações na hora de contratar

Fonte: Site do jornal O Globo

Processos seletivos mais lúdicos e tecnológicos tornam recrutamento mais eficiente

Nesses tempos em que o instantâneo e o tecnológico ditam nossos passos, quanto mais ágeis e dinâmicos forem os processos seletivos, mais certeiros serão seus resultados. Com isso, empresas adotam métodos de recrutamento cada vez mais high-tech e lúdicos, especialmente quando buscam jovens profissionais. Algumas já começam a usar tais recursos até na contratação de profissionais com mais idade e experiência.

Entre os novos modelos, estão o vídeo selfie (uma espécie e currículo falado), a realidade aumentada nas dinâmicas de grupo, testes online, games e até o auxílio de inteligência artificial e big data (algoritmos) no cruzamento de dados.

Diferentemente de décadas atrás, em que prevaleciam o chamado “QI” (quem indica) e os conhecimentos técnicos nas contratações, hoje, o alvo é quem esteja alinhado à companhia — o chamado fit (encaixe) cultural. O match perfeito…
— O fit cultural é o mais importante no processo de recrutamento porque dele vai depender o sucesso do colaborador aqui dentro. A L’Oréal, por exemplo, tem uma cultura empreendedora e de diversidade muito forte. Por isso, precisamos de pessoas que codifiquem os diferentes tipos de empoderamento para criar experiências e produtos alinhados com as necessidades do nosso consumidor. Ter isso no DNA faz muita diferença — explica Sara Mariotti, diretora de Recrutamento e Seleção da L’Oréal Brasil.

Ela conta que os processos na empresa começam antes mesmo das inscrições, por meio do desenvolvimento de conteúdos em redes sociais para atrair novos talentos.
— Não falamos diretamente da marca, mas mostramos casos de sucesso e como é trabalhar conosco. Esta ação atrai quem está alinhado à nossa cultura e a seleção já começa ali.

GAMES PARA AVALIAR COMPORTAMENTO E RACIOCÍNIO

Outro modelo que tem feito sucesso é a gameficação (jargão de RH para a dinâmica que recorre aos jogos).
Neste processo, os candidatos são postos à prova para resolver questões práticas da empresa. O objetivo é que, por meio de simulações, os recrutadores possam conhecer previamente como eles se comportam e lidam com problemas do dia a dia na companhia, assim como avaliar a personalidade, raciocínio, criatividade e senso de colaboração, entre outras características. Isso reduz os erros na contratação.

Este ano, a inteligência artificial (filtro que cruza dados e informações das fichas de inscrição) ajudou a Vivo a ranquear os melhores candidatos, tanto nos aspectos técnicos quanto comportamentais. Segundo o gerente de Atração de Talentos, Willian Katayama, a empresa estuda outros métodos pouco tradicionais de seleção.
— As ferramentas digitais impulsionam a eficiência das contratações. Já não basta selecionar alguém apenas por suas competências. Hoje precisamos considerar valores, cultura e diversidade — afirma.

Nessa modernização, algumas companhias buscam o auxílio de startups para ajudar nos processos de contratações. Na Expansão, empresa de treinamento que desenvolve este tipo de seleção que mistura lúdico e tecnológico, foi criado um jogo chamado Valentes do Mar. Com o uso de óculos de realidade virtual, os candidatos são divididos em grupos para um desafio em etapas. O objetivo é avaliar comunicação, liderança e planejamento e postura sob pressão.

Na seleção para trainee deste ano na Johnson & Johnson, por exemplo, foram chamadas sete startups para apresentar um problema real enfrentado, que deveria ser resolvido pelos candidatos em equipe. Os aprovados nessa etapa seguiam para entrevistas individuais com o RH e com o gestor do setor onde iriam trabalhar. Alguns candidatos que não passaram, foram chamados pelas próprias startups.

PRIMEIRO PASSO

Já na Nestlé, há dois anos, foi usado um método chamado Escape 60: os candidatos têm que desvendar desafios reais da empresa.
— Um dos desafios era descobrir qual a melhor forma de dar visibilidade a um produto em um ponto de venda — conta Ana Schiavone, especialista de recrutamento e seleção da Nestlé Brasil.

No ano passado, as etapas tradicionais, como perguntas técnicas e comportamentais foram parar num aplicativo para os candidatos.
O bom e velho contato pessoal com o gestor ainda é a última cartada antes da contratação. Entretanto, os novos recursos ajudam a peneirar de maneira mais rápida e precisa no início e, portanto, a otimizar o tempo e a diminuir os custos.

De acordo com as corporações, a tecnologia não é apenas para atrair o público jovem e agilizar o processo. Facilita também a vida dos recrutadores. Em muitas destas empresas, as inscrições para trainee chegam a a 30 mil candidatos, caso da Nestlé na última edição.

FILTRO ÀS CEGAS E TREINAMENTO INTENSO

A modernização não é apenas nas ferramentas. O conceito dos processos seletivos também está mudando. Algumas companhias têm usado o método de seleção às cegas. Nessa modalidade, o primeiro filtro da seleção é feito a partir de informações como experiência profissional e compatibilidade com a cultura da companhia, desconsiderando informações como formação, sexo, gênero ou idade.
Rodrigo Vianna, CEO da Mappit, especializada em identificar jovens talentos, explica que nesse tipo de processo o candidato preenche a inscrição normalmente, com todos os seus dados e informações curriculares, e responde a alguns questionários, os quais, geralmente, focam na sua personalidade. A diferença é que o departamento de recursos humanos fará uma busca com filtros específicos.
— No recrutamento às cegas o grande valor é tratar a diversidade. O que acho mais relevante é que cada empresa tem a sua dinâmica para mudar o filtro do recrutamento — diz Vianna, lembrando que é importante, também, preparar quem vai executar o processo.

A Votorantim Cimentos é um das empresas que está implementando neste ano a seleção às cegas em seu programa de trainee.
— A ideia é valorizar a história de cada um em vez de fazer uma escolha de acordo com a instituição de ensino. Muito mais do que uma boa formação, queremos alguém que tenha o perfil, valores e cultura da empresa. Esta porta de entrada abraça a diversidade — afirma Cristiano Brasil, diretor de Gente e Gestão da Votorantim Cimentos.

A mudança, segundo ele, segue uma evolução natural:
— Hoje temos a convicção de que o candidato “ter a cara da empresa” é mais relevante do que uma formação formal. O conhecimento é mais disseminado, por isso, o lado comportamental é mais relevante.

A Vale é outra companhia que está atenta ao que os jovens desejam. Para o novo programa de estágio, que será lançado no mês que vem, foi criada uma dinâmica virtual em que o candidato responde a um questionário para determinar sua “escala de crenças”. Depois, suas respostas são cruzadas com os valores da empresa — a cada match, o candidato vai ganhando pontos.

A diretora da consultoria LHH no Rio, Cristina Fortes, acredita que a tecnologia é bem útil para a agilidade e o índice de acerto dos processos seletivos. Ela, contudo, contrapõe que a entrevista presencial continua a ser muito relevante.
— Hoje, as empresas estão buscando inteligência artificial e métodos mais ágeis e baratos para encontrar os seus candidatos, pois a contratação certa minimiza o prejuízo. Mas em algum momento do processo seletivo deve haver o contato humano — afirma.

PROCURA-SE: SEM EXPERIÊNCIA

As mudanças não se restringem à contratação: as formas de treinamento também estão mudando.

O Grupo Madero tem 124 restaurantes e 5 mil funcionários, sendo que pretende chegar a 200 unidades e 10 mil empregados até 2020. Para conquistar seus recém-contratados, aposta em uma imersão de cerca de 60 dias para todos os seus novos trabalhadores, além de alguns benefícios diferentes, como moradia perto do local de trabalho.

Os candidatos escolhidos são, preferencialmente, jovens com pouca experiência e que nunca trabalharam em redes de restaurantes ou lanchonetes.
— Gostamos de moldar para não que não tenha vícios — explica o vice-presidente de operações do Grupo Madero, Rafael Mello.
Para isso, a partir do momento que a empresa abre uma unidade, começa a seleção na região.
— Depois que são selecionados, eles vão para nosso centro de treinamento, onde aprendem as técnicas, desde a fazer o hambúrguer até a atender bem o cliente. Alguns já vão para Curitiba com sua posição escolhida e outros serão encaminhados após a capacitação — diz.

Segundo Mello, tanto investimento tem retorno, pois mantém a qualidade na entrega e no atendimento, contribuindo para a perenidade da marca e expansão da rede:
— Ter profissionais que já chegam prontos às nossas unidades reduz a margem de erros.

Outro ponto é a baixa rotatividade. Segundo Mello, apenas 2%. Nesse quesito, conta, há outros atrativos além do treinamento:
— O salário acima do mercado e benefícios como a opção de morar perto de onde trabalha em um alojamento para funcionários ajudam a manter o turnover baixo. Mas o que mais faz a diferença para este jovens é o plano de carreira. Saber onde está e onde pode chegar — enfatiza.
— Uma das tendências mais interessantes é o das empresas que transformam os processos de recrutamento e seleção em jornadas de experiência do candidato. Isso significa que além de participar dos habituais testes, as companhias investem para criar eventos de troca aprendizado, interação e até mesmo oportunidade de network — pontua Thiago Xavier, gerente de projetos de Page Outsourcing.

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